A CORRIDA NÃO É SEMPRE PARA O MAIS RÁPIDO...... MAS PARA AQUELE QUE CONTINUA CORRENDO.

domingo, 14 de junho de 2009

HISTÓRIAS DE OUTRAS CORRIDAS

A CONTINUIDADE DO BLOGUE

Decorria o ano de 2049, ele e ela tinham uma diferença de dez anos. Ele contava com noventa e duas primaveras, ela com oitenta e duas, à muito que tinham deixado de correr, mas ela passava horas agarrada ao computador continuando a alimentar o seu Blogue com um nome feminino fictício, narrando as suas corridas passadas, e assuntos relacionados com o tema, que ia pesquisando na Internet.
Era ele que a incentivava a não acabar com o blogue embora ela já com pouca paciência, tivesse feito algumas tentativas para o encerrar. Faz-te bem dizia ele, ajuda-te a pensar.
As suas mãos trémulas, e encarquilhadas com o tempo, já não conseguiam teclar, mas também não era necessário, porque sempre podia ditar os seus textos e o computador ia escrevendo.
Os assuntos eram descritos no Blogue, como se ela ainda tivesse quarenta anos e continuasse a correr.
Ele estava num canto da sala, entretido a ouvir música, olhava para o relógio pendurado na parede, levanta-se de repente, dizendo-lhe, vou andar pelo Parque, queres ir, ela respondeu, claro, ainda hoje não fiz nenhum exercício físico.


Estavam os dois em fato treino e calçados com uns bons ténis, para não magoar os pés, experiência adquirida de muitos anos de corridas, era a sua indumentária diária.
Quem via aqueles dois a andar no parque em passo acelerado não adivinhariam a idade que tinham, ficavam era admirados por os verem a andar. No Parque ninguém caminhava ou corria andavam em pé nuns veículos de duas rodas que eram conduzidos na vertical
Pergunta ela, queres descansar? responde ele, eu não, ainda só caminhámos 1 hora, temos que completar 1 hora e trinta minutos de treino.
Ele como sempre era metódico com o seu planeamento de treino, todos os dias à mesma hora, faziam uma hora e meia de caminhada, ao longo dos últimos 15 anos, desde que tinham deixado de correr.
Ela já não lhe apetecia caminhar mais, o que ansiava era voltar para o seu computador e continuar a “alimentá-lo” como o fazia desde 2007, mais por força do hábito, e não da vontade.
Mais uma vez fez-lhe a vontade, ele era teimoso nestas coisas de treinar e caminharam a meia hora que faltava.
Chegaram a casa cansados, ela dirigiu-se para a casa de banho como sempre ia para o duche primeiro que ele.
Ficou na sala à espera da sua vez de tomar banho, relembrando as suas proezas, folheando uma revista desportiva antiga de 2010, de Atletismo, desporto que tinha praticado durante 20 anos, modalidade esta já extinta, agora havia corridas, mas em tapetes rolantes, quase sem esforço dos atletas praticantes desta nova modalidade desportiva, aliás todas as modalidades em que exigiam esforço foram extintas por falta de interesse das pessoas, cada vez mais acomodadas nos seus luxos, onde não entrava o esforço.
Os desportos praticados hoje em dia ou eram electrónicos ou mecanizados.
Ritualmente após o jantar, sentavam-se em frente da televisão comandada pela voz, não para se ligarem à Internet ou telefonarem aos familiares ou mesmo para verem horas de publicidade, ou programas sem interesse, mas para verem os vídeos da sua participação nas corridas populares por toda a Europa.
Mais um dia passado, pergunta ele, na hora habitual, vens caminhar, ela responde, hoje não vou, não me sinto bem, ele com o carinho que nutria por ela disse, nesse caso também não vou.
Ficaram sentados nos sofás da sala, de mãos dadas, ela adormeceu e ele manteve-se impávido olhando para ela com uma expressão de ternura.
Tinham terminado as caminhadas para ela.
Passados alguns dias ele voltou à rotina habitual, sai diariamente para fazer a sua caminhada, ao longo do percurso vai falando de vários assuntos com uma companheira imaginária, como se ela caminhasse a seu lado.



Chega a casa toma um duche e senta-se em frente do computador, ditando um texto, continuando assim a “alimentar” o blogue dela, como ela o faria se ali estivesse.


Até já

9 comentários:

  1. Muito bem José Lopes! Gostei de ler. Foi mesmo o José que escreveu?

    Pois surpreendeu-me. Pela positiva, não lhe conhecia esta faceta de narrativa e ficção.

    Bonito, gostei de ler.

    E que chegue pelo menos a 2049 e a fazer as suas caminhadas com a sua companheira.

    Entretanto até lá, continuação de bons treinos e boas provas, e já agora, boas ideias para escrever,

    Um beijinho
    Ana Pereira

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  2. Obrigado pelo elogio.

    Claro que fui eu que escrevi.

    Às vezes as pessoas também nos surpreendem pela positiva.

    Têm atributos que só pelos posts nos blogs não conseguimos descobrir.

    Continuação muitos e bons treinos

    Bjs
    J.Lopes

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  3. Parabéns, também gostei muito. Boa semana

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  4. Caro José
    parabéns pelas palavras deste post, gostei muito.
    Ainda bem que, como diz, às vezes as pessoas também nos surpreendem pela positiva.
    Continuação de boas corridas e de palavras.
    Abraço.

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  5. Caro José:

    Lindo, demasiado lindo para eu ficar calado.

    Muitos parabéns e continue a correr e a escrever,

    Abraço

    José Alberto

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  6. Obrigado pelos elogios
    Sabem bem


    Boas corridas para todos
    Com os cumps
    J.Lopes

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  7. Olá José

    Um belo tema. Um olhar sobre o futuro como um Júlio Verne ou um Kubrick, onde a máquina substitui o Homem e este morre de tédio por não fazer coisa nenhuma.

    Neste texto está toda uma existência que bem poderá ser a sua pois até o blogue tem como princípio o ano 2007 que foi o ano que o José começou este blogue.

    Curioso, ou talvez não, é o facto de ter sido o mais idoso a ficar e continuar a ditar a sua existência passada como garante de uma experiência adquirida fruto dos anos em que os seus pés calcorreavam as estradas, junto com os muitos companheiros que já tinham perecido nos caminhos da vida.

    O olhar para a companheira, as mãos já trémulas e encarquilhadas, o andar de mãos dadas num tempo em que já tudo é virtual, onde a vida em comum não passa de uma miragem e a palavra Amor não passe de algo perdido nas veredas do tempo.

    Um texto lindo, e como aconteceu em Canaã na Galileia, deu-nos o melhor de um tema livre logo na primeira refeição.

    Continuação de bons escritos e de boas corridas.

    Abraço!

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  8. Obrigado Mário

    Pela análise deste texto

    Nestes próximos meses teremos que colocar a nossa imaginação ao serviço dos posts, sobre corridas, devido a estarmos já a pensar nas férias, e a participação em corridas ser escassa.

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  9. Fantástico.
    Consegues ser descritivo ao ponto de eu estar a ler este texto e conseguir imaginar tudo, os gestos, as vozes, o caminhar apressado.

    Parabéns Zé!
    Adorei.

    Beijinho

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